O Direito do consumidor é maior do que sua lei principal. E mais antigo. Boa parte das conquistas já estava se solidificando pela jurisprudência quando veio o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Mas não se pode — e nem se quer — desvalorizar um dos mais importantes instrumentos legais da nova era. Ele trouxe novidades que ainda encontram resistência no mundo ocidental, como a inversão do ônus da prova, e sacramentou a responsabilidade objetiva, teses que não se sonhava, à época de sua edição. É uma das mais importantes ferramentas de defesa da cidadania neste país.
Este foi o ano em que o CDC completou 20 anos. As comemorações foram inúmeras. E há muito a comemorar. Mas também foi um ano que trouxe, com mais ênfase, temas que têm sido, reiteradamente, objeto de preocupação dos estudiosos dessa área do Direito.
Se é certo que cada vez mais se aperfeiçoa a regulamentação dos direitos dos consumidores (com novas normas, algumas, aliás, bem estranhas), não é menos exato que a questão dos órgãos de defesa do consumidor (Procons) e das sanções ainda está pendente de um melhor solução.
Os Procons têm se organizado para atender aos seus interesses e dos consumidores. É que no rol das suas obrigações, há a de tentar conciliar interesses de consumidores e fornecedores e também de proceder a fiscalizações e aplicar sanções. A preocupação com a falta de uma orientação uniforme pelos Procons sobre qual a melhor interpretação das condutas das empresas e o fato de todos eles poderem, indistintamente, multar fornecedores que consideram infratores, foi levantada inclusive pelos autores do Código, nas vezes em que se manifestaram nas homenagens que tiveram este ano. Par e passo, os Procons estão buscando uma solução mais ágil para efetivar suas multas, que param nos meandros dos recursos administrativos e nas medidas judiciais.
Esse tema, que tem sido objeto de alerta ao longo dos anos, cresceu muito em 2010. É necessário achar uma solução, que passa pela Constituição. E rapidamente.
Outro tema que ganhou ímpeto em 2010 foi a necessidade de uma melhor compreensão pelo Poder Judiciário, dos temas empresariais e das transações eletrônicas. O primeiro se destaca pela manifestação recente de um ministro do STJ a respeito do elevado número de ações de instituições financeiras, cartões de crédito em especial (como se pudesse ser diferente). E o último, pelo afã de responsabilizar a todos por temas que não se conhece profundamente, como são os sítios de venda pela internet, especialmente os que apenas aproximam vendedores privados. E vêm aí as compras coletivas, com grandes volumes e destaque! Com o significativo aumento desse tipo de transação, algumas envolvendo compras em diferentes países, o que antes era matéria para estudiosos, com raros casos concretos, vai tomar de assalto os Juizados Especiais, foro preferido dos consumidores.
Nunca é demais lembrar que as atividades das empresas são mais complexas do que se imagina. As políticas de preços levam em consideração inúmeros fatores, entre os quais está evidentemente o apelo emocional. Mas este não é o único. Há estratégias importantes, que ajudam a favorecer os de menor poder aquisitivo (afinal, o que as empresas querem é vender mais para mais pessoas, diluindo o risco de perda). Por outro lado, não se pode deixar de ponderar que as empresas não podem buscar o lucro fácil e nem iludir os consumidores. Tentativas nesse sentido devem ser prontamente repelidas. E isto tem ocorrido.
Aliás, por sua diversidade nacional, os Juizados acabam trazendo intranquilidade no que se refere a temas polêmicos, o que tem levado as Cortes superiores nacionais a verdadeira ginástica para fazer valer suas teses. Algumas confusões têm sido levantadas por conta do Poder Judiciário. No Rio de Janeiro foi determinada a autenticação de dezenas de documentos das empresas, o que acarretaria custos incríveis. Tal medida acabou sendo revogada. Também se tem visto manifestações de juízes contra as Reclamações junto às cortes federais superiores. Trata-se de medida hoje absolutamente necessária, como único instrumento para unificar o entendimento dos Juizados Especiais. Há que se respeitar questões culturais entre os estados da Federação. Mas o entendimento jurídico do que é lícito ou não, deve tender à uniformidade.
O que se observa, em resumo, é que, paralelamente aos avanços nos temas em que os consumidores merecem proteção, que vem ocorrendo desde o início de vigência do Código, este ano, o cuidado em separar as condutas das empresas se manifestou mais fortemente, ainda que para regulamentar as punições.
Já em dezembro, foi encaminhado para sanção, o projeto de lei sobre o “cadastro positivo”. Até o encerramento desta matéria ainda não se sabia o que o presidente decidiu. Trata-se de uma das mais esperadas medidas no que se refere à área financeira, e que estava a cargo do Poder Legislativo. Inúmeras vezes o presidente pensou em editar uma medida provisória a respeito. Há uma expectativa grande da redução dos juros, argumento utilizado pelos bancos na defesa desta norma. Não será facilmente percebido, mas deverá ocorrer. Especialmente ao longo dos anos, quando a política do cadastro positivo se solidificar, derrubando barreiras que existem até mesmo dentro dos fornecedores.
Enfim, 2010 foi um ano interessante pelo avanço nas regulamentações, mas também chamou a atenção pelo fato dos Procons terem se preocupado, junto com os estudiosos, na busca de novos caminhos para as questões administrativas.
Fonte: www.conjur.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário